Aline Oliveira
Primavera de 94
Mudei-me da Qd 12 pra Qd 2.
Resignada... revoltada. Eu tinha toda uma história naquela quadra que eu morava...
Na casa ao lado uma menina super simpática, risonha e falante me apresenta ao pessoal da rua.
Pessoalzinho mais ou menos. Desconfiava de tudo e todos. Rua estranha dividida em começo da rua, meio e galera do quadradão... coisa estranha. Na 12 era a rua inteirinha unida. De uma ponta a outra da quadra.
E ele?! Sequer notou minha presença...
A menina falante me apresentou a ele, mas ele sequer chegou a fitar-me os olhos.
Preparativos pra Copa...
Maravilha... A menina falante e os outros da rua já podiam ser chamados de amigos. E eu os via realmente como amigos. Todos nós envolvidos em enfeitar a quadra e fazer vaquinha pra comprar td que seria consumido durante os jogos. Telão de um na parede de outro, com som de outro, e todo mundo unido. Até o irmão que nem olhava nos meus olhos agora já conversava comigo... Sim acho que estávamos perto de uma amizade... Mas eu continuava sentindo aquela sensação horrorosa cada vez que ele chegava perto.
Brasil ganhou. Felicidade.
Em comemoração à vitória fomos para a chácara dos pais da menina falante e sorridente que se tornara minha mais nova melhor amiga. Além dos pais dela e nós, foram também o vizinho da esquerda que era o melhor amigo do irmão dela,e claro, pra meu desespero, confusão e felicidade, o irmão dela.
Meu Deus, nunca tinha ficado tão feliz em estar espremida no banco de trás de um carro. Foram o pai e a mãe dela no banco da frente e nós quatro no banco de trás. Eu bem pertinho dele, encostadinha nele e de novo aquela coisa que me espremia o estômago e me tirava o ar voltava a me atormentar.
Que coisa estranha era essa que eu não sabia descrever nem controlar? Sei que todo mundo falava comigo e eu não conseguia fazer nada além de implorar pro meu coração bater mais devagar e mais baixo um pouquinho pq a impressão que eu tinha era que todo mundo tava escutando ele acelerado e tão desesperado quanto eu.
E surge a proposta tentadora da minha mais nova melhor amiga e cúmplice de todas as minhas novas experiências. Era chegada a hora de mais uma. "Vamos experimentar Cuba-libre?" - perguntou ela. Hesitei a princípio, mas quando lembrei da dor avassaladora que me consumia, decidi que não havia melhor hora. Já no terceiro copo daquela mistura meio doce, meio amarga, eu sentia que começava a perder o absoluto controle sobre alguns órgãos do meu corpo. Além de alguns músculos, tecidos e membros. Os braços, que já não eram tão fáceis de controlar por causa de seu tamanho que aumentava dia a dia, tornaram-se ainda mais desastrados e minha cabeça, já normalmente muito confusa e agitada, agora inventava rodopios que só eu percebia. Tomei mais uns copos, desta vez com um pouco mais de pressa, na esperança de me livrar destas novas sensações, mas que para minha infelicidade fizeram aumentar a intensidade de tudo que eu estava sentindo e, debaixo de uma lua cheia e iluminada, resolvi me aproximar daquele que fora ao mesmo tempo meu herói e meu vilão. Eu só havia esquecido dos sintomas que me acometiam cada vez que eu me aproximava dele. E assim como o Super-Homem não se controlava quando exposto à terrível pedra, assim eu, não pude controlar as palavras que saíam da minha boca. Muitas delas quase inaudíveis, por causa do leve adormecimento que tomou minha língua, e então, zonza, proferi um:
-Eu to apaixonada por você... e quero um beijo.
- Sinto muito, linda. Não posso fazer isto com você. Não quero que você sofra, mas não seria justo receber este seu carinho sendo que meu carinho pertence a outra menina.
Nessa hora, aqueles sintomas que sempre aparecem quando me aproximo dele voltaram. Então minha cabeça começou a girar e que vontade de chorar. Que vontade de sair correndo. Meu estômago estava sendo espremido e, não!!! Oh não!!! Tantas emoções misturadas a tantas cubas só podiam ter um desastroso resultado. Pelo menos tudo, absolutamente tudo, que estava me incomodando até aquele momento coloquei, literalmente, pra fora.
Vergonha, conheci o verdadeiro significado desta palavra nesta noite. Mas eu pelo menos estaria em contato com ele por um bom tempo, ainda que indiretamente. Ou pelo menos algo que saiu de mim estaria.
-Ele está se limpando depois do banho de líquidos indistingüíveis que você deu nele.
Ai que horror. Foi de verdade. Aquilo realmente aconteceu.
Tentei me restabelecer e fomos para o quarto dormir. Todos nós dormindo no mesmo quarto. Eu, meu herói/vilão, o vizinho e minha melhor amiga. No meio da noite um frio tenebroso misturado ao meu choro de vergonha e desalento fazem minhas cobertas tremularem. E mais uma vez ele veio me salvar. A despeito de todas as coisas horrendas que aconteceram durante o curso daquele dia, ele dividiu sua coberta comigo. Eu nunca dormira tão feliz até aquela noite.
Inverno de 2007.
Vários acontecimentos nos afastaram, mas de uma forma ou outra sempre estivemos próximos. Até que num despretensioso jantar de reencontro voltam todos aqueles sintomas há muito esquecidos. E desta vez, pelo menos, eu estava mais sóbria que da primeira. Mãos que brincam, rostos próximos, respiração quente e gostosa, um beijo que me leva ao passado como num túnel do tempo e me traz de volta ao futuro, carregando, impregnado em mim, todos aqueles sentimentos que inundavam aquele coração tão ingênuo e imaculado pelas paixões.
Que situação diferente. Agora não sou eu que peço. É-me roubado. Mas que belo presente de dia dos namorados. Hoje já não mais uma menina. Nem tão imaculada. Mas incrivelmente ele permanece herói. Preocupa-se tanto com o fato de não poder ter me protegido de todos os outros perigos da vida. E eu continuo, ali, sem falar nada, apenas fitando-o, observando este jantar à luz de velas regado a vinho tinto, ao som de uma voz feminina e melodiosa que toca algumas músicas românticas, rindo penso comigo mesma:
- Como o mundo dá voltas...
2 comentários:
Ah! Q fabuloso
Primeiro post foi tudo d bom!
Um verdadeiro conto..
Nossa.. teve parte q me fez lembrar da infancia mesmo... e isso q uma pessoa q escrever tenta fazer... e vc me fez voltar..
Nossa... fabuloso d novo..
a parte do Herói/vilão... foi a melhor!!!
Espero outro...
Bjaum Danada
Amo vc :) muitão!!
Belo post! começou bem hein Nine!
=)
é legal ler coisas que misturam ficção com a realidade...
se torna indiscutivelmente belo...
parabens
=D
beijos
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