CANTO E LÁGRIMA: VIDA INTENSA E NÃO REGIDA

"Regida demais, intensa de menos. Lágrimas engolidas pelos cantos da alma que não tem tempo pra sorrir, chorar, sentir. Mãe, irmã, filha, amante, dona de casa, esposa, profissional exemplo..." Relatos das várias mulheres que se escondem dentro de cada mulher, seu mundo, intocável para aqueles que só enxergam com os olhos da carne.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

EU QUERO


Eu quero o riso e o sorriso
Quero o desencontro
Que traz o inesperado
Na forma doce de surpresa no caminho

Eu quero o grito e o sussurro
Quero o entrelaço 
Que junta corpos num só ato
Do jeito quente que brincam os impuros

Eu quero a fantasia e o real
Quero o abstrato
Na forma mágica de sonho
Na concretice da coisa-fato

Quero coisa onde fui bicho
Quero bicho onde fui gente
Quero gente onde fui coisa

Eu quero TUDO
Eu quero NADA
Eu quero ir e ficar
Quero sonhar sorrir dançar
Quero transcender
Quero transformar

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

A hora do encantamento

ra quase meia-noite. A lua cheia tomava a cena num céu violeta. Uma mulher caminhava na rua vazia, testemunhava o espetáculo de camarote. Cabelos muito escuros unidos em uma longa trança colada na cabeça. Alguns fios dançando esvoaçantes, fugindo das regras do penteado como ela gostaria de ousar com as regras de sua vidinha correta demais.
                 Um vestido cinza azulado mostrava discretamente as linhas dos seios não tão fartos e marcava-lhe a silhueta de mulher bem feita. Exibia quase metade de suas longas pernas um tanto finas, que terminavam em um salto alto, quase da cor do céu, que lhe cobria os pés e chamava o olhar para seus passos leves, como se flutuasse...     
                 Há tempos que tinha adoração por sapatos e por aquela cor sempre fora fascinada - dos sapatos e do céu, que parecia carregar em sua essência propriedades mágicas. E naquela noite em especial algo aconteceria que a mudaria para sempre.
                 Caminhando distraidamente, o olhar para o alto, começou a perceber as cortinas esvoaçantes, ora translúcidas, ora sombrias, escondendo as cicatrizes meteóricas da protagonista daquele céu.
                 Distraída e encantada como seguia nem notou que o relógio atravessara para o outro dia e continuou andando, agora já sem saber para onde ia. Tropeçou em alguma coisa, quase caiu, mas não... Olhou para os próprios pés e reconheceu neles os sapatos de boneca que lhe foram dados por papai anos antes, no dia em que ele não voltou mais. 
                 Um susto! Que estranho!!! Havia mais um punhado de anos que precisara se desfazer dos adorados sapatinhos vermelhos de tão velhos, já sem cor, abrindo bocas famintas no solado.
                 Seguiu andando até a loja de vestidos onde podia se ver no reflexo da vitrine. Assustou-se ainda mais. Reencontrou-se ali com a menina de 14 anos com o vestido poá que levava um delicado laço vermelho de cetim na cintura. O vestido perfeito para calçar os sapatos de boneca. Cabelos sempre muito negros, todavia neste cenário, livres ao vento como seu coração ainda ingênuo.
                 A sensação de estranhamento tomava conta, só que não tinha medo. Parecia-lhe que atravessara uma linha no espaço-tempo onde podia ser a lua, protagonizando, dançando sozinha na escuridão por detrás das cortinas transparentes de umas nuvens ora lilases ora rosadas como a pele de suas bochechas.
                 De longe se ouvia, de repente, um LP tocando "A Valsinha" do Chico e depois a "Joana Francesa". Olhou para os lados. Não havia ninguém... E se houvesse? Fechou os olhos, abriu os braços e como que tomada pelo cavalheiro se pôs a valsar e depois a girar. Desligada de tudo o mais, testemunhada pela brilhante amiga redonda.
                 Obedeceu ao Chico e abriu os olhos.
                 De novo o reflexo na vitrine, porém não eram mais os sapatos vermelhos nem a fita de cetim. Eram de volta os tons azul-violáceos e as variações de preto e cinza, mas os cabelos... Não havia mais trança, havia longas ondas negras dançando quase no ritmo da música que continuava em outra voz e agora falava da "mesma taça" e da "mesma luz brilhando no champagne" em um café parisiense...
                 Girou mais uma vez, como um pião, sentindo-lhe o vestido subir mostrando os joelhos e um pouco acima. Gargalhou deliciosamente, olhou para o relógio atrás dos vestidos e viu que não era ainda meia-noite. Novamente uma sensação de estranhamento. Deu um suspiro curioso, subiu e baixou os ombros como quem não liga e seguiu a passos rápidos pensando: Teria vivido um momento mágico ou teria sido loucura?


                      

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

1º ensaio sobre as cores: BRANCO

De todas as cores a mais tola é a branca. Branco tá em todo lugar e é tão cor quanto Preto em sua ausência de cor. Luz, matiz, tanto faz... Preto e Branco são todas as cores mas mergulha neles a ausência, o vazio, o monotonamente comum. Até Cinza é mais cor que isso!

O Branco cansa, engole, domina e não tem voz. Ele só PODE. Pode tudo sozinho, misturado ele não é mais..!

Ele sufoca, castra. Ele determina os limites, ele gosta dessa sua missão de Bedel das cores e carrega a arrogância das almas NÃO prontas, NÃO vividas, NÃO sentidas.

O Branco é puro imaculado! O casto! O sem crimes nem pecados! O sem vida!

Ele é bruto, grosso, dono de todas as verdades e normas e é doce, suave, confortável, disponível... Fácil... O Branco é a arrogância da  solidão da prostituta! A prostituta carrega todas as cores e nenhuma! A menina, a mulher solitária e a bailarina têm as cores que o Branco não respeita. A prostituta carrega o desrespeito. O Branco é a arrogância do medo!

É tudo isso até cruzar a primeira cor! Aí vem a mácula, aí vem o escárnio... em sua alma de puta o Branco chupa a cor até ela perder vida, cansa explora, fode com a cor e depois declara: Melhorei ela, suavizei!

O Branco é a puta do Preto. Filho de puta não nega o pai, filho de Preto com Branco é Cinza, e Cinza é cor! Cinza carrega curiosidade, carrega vida, melodia... Tá bom que não é um Vermelho, um Azul, um Amarelo vivos ou mortos mas Cinza é a cor das sandálias da bailarina. Quer mais vida!!?

Cinza é a vida escondida, inesperada... Cinza é a salvação do Branco!