CANTO E LÁGRIMA: VIDA INTENSA E NÃO REGIDA

"Regida demais, intensa de menos. Lágrimas engolidas pelos cantos da alma que não tem tempo pra sorrir, chorar, sentir. Mãe, irmã, filha, amante, dona de casa, esposa, profissional exemplo..." Relatos das várias mulheres que se escondem dentro de cada mulher, seu mundo, intocável para aqueles que só enxergam com os olhos da carne.

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

A LUZ



        Aquela mocinha vira muitas coisas, mas nunca brincava, nunca sorria, era estática. Tudo sentia mas não era e não falava, engolia e olhava para dentro. Fora: cinza, preto, branco e, de vez em quando um pálido ou sombrio sépia em tons de tristeza. 

       Ignobilmente, por isso, ninguém a incomodava, ninguém a escolhia para brincar nos tempos de escola, mas também ninguém lhe puxava os cabelos. O que ninguém também enxergava era que por dentro ela era só cor e luz, e formas encantadas de um mundo muito mais envolvente que aqueles tons de fumaça acinzentados. 

     De dentro, brinquedos de faz de conta, amigos, namorados, bolas e bexigas e flores, muitas flores de todas as formas e tamanhos e cores, e vivas, e muitos sóis, porque um só é pouco para tanta luz. Chuva lá dentro, só de coisas estranhas, quer dizer, estranhas do lado de fora, porque de dentro o normal é chover caramelo, mel... pra comer com partes exóticas!

     Vermelhos aquecem seu corpo brincando de dedilhar enquanto os mais suaves tons de violeta e lilás lhe acariciam os negros cabelos, em fitas de cetim e tranças rendadas. Os sapatos de boneca rubros dizem o caminho e ganham fitas para subirem-lhe as pernas. O vestido poá ganha saias e mais saias e a pequena mulher menina, de repente, vira bailarina rodopiando pelos caminhos tortos cheios de borboletas para lhe voar pelo estômago e por umas partes impróprias.

      Volta e meia entre rodopios e banhos de caramelo ela esbarra com um moço bonito ali, um moço de olhos profundamente líquidos e de umas nuances encantadoras. Com uma espada embainhada e muitos sonhos voando como pássaros em volta de seus cabelos revoltos e macios como fios de seda ao vento. 
Ela adora tocar-lhe os cabelos, quase como quem comete um pequeno delito..!

     Ele não é dali, não pertence a seus sonhos, ele carrega todo um mundo próprio de dragões, torres e calabouços. E sóis, e luas e a luz encantada que atravessa os sonhos. É onde ela se reconhece, é onde se entrecruzam suas alegrias e suas vontades e se faz magia. Ali o caramelo brilha num suor saboroso. Ali as mãos peregrinam por caminhos montanhosos. Churros e maçãs do amor com gosto de beijos. Discos voadores e bolhas de sabão dão vida à paisagem. E a magia se faz também um pouco pela importância. Qual?

     Churros, maçãs do amor, bolhas de sabão e até discos voadores são fáceis de se encontrar por ali. Beijos também não são tão raros, mas o garoto mágico, o garoto da espada, ele só aparece quando. E quando é o tempo cruel. Quando é o tempo que não manda, que nada prevê, é o tempo que acontece e deixa marcas tatuadas de singularidade. O sabor inesquecível que as pessoas predestinadas reconhecem uma na outra. 

     Só que ali ela também sabe que, apesar de ser senhora da paisagem, é impotente para tudo além das cores e do mel, do caramelo... O gosto, que não é só dela, não pode ser alcançado sem ele. O garoto não vem quando ela quer, também não vem só quando ela ali está. Eles se perdem... Labirintos os guiam por tramas onde às vezes o sim é não, o não talvez, e o talvez traz um meio de caminho que pode durar pra sempre ou acabar num vazio de alma.

     Ali está sua dor e sua alegria, ali mora seu momento e ela se renova e se desconstrói se necessário. É justamente em sua falta de controle que ela encontra sua essência. É assim, sabendo que há algo que ela não domina, num mundo que poderia ser só seu, que ela percebe que em algum momento deixou ele entrar, lhe deu a chave. Ninguém mais povoa aquele lugar a não ser que seja fruto de sua imaginação, mas aquele moço bonito... 
         
     Ele é real, ele vai e vem, e ele era um pouco sua criação também... quando a amava e a partia. Seu amor e seu amigo. Seu brinquedo de faz de conta que aconteceu mas que não foi de encontro ao seu futuro. Ele se emaranhou em seu presente e dali não saiu... nem ficou... Ele se tornou seu meio, entre o cinza costumeiro e a energia celestial do lilás: a luz!

sábado, 23 de novembro de 2013

SONGES ET MENSONGES


CHEGOU DESPRETENSIOSO
UM SORRISO NOS OLHOS PÁLIDOS
NAS MÃOS, ELOS COM O PASSADO
MUITOS DEDOS PRA NÃO TOCAR (ME?)

A VOZ SUAVE, MACIA
UMAS PALAVRAS PRA ENCANTAR
NUM GRAMADO, UM DIA CLARO
UM QUENTE RAIO DE SOL
DESPIDO EM TONS DE LUAR

BOLHAS BRILHANDO NA TAÇA
OUTRAS BRINCANDO DE VOAR
ESTRELAS, MUITAS DELAS
E AS CORES E AS BORBOLETAS...
PERFUME DE FLORES NO AR

À NOITE, OS SONHOS A FANTASIA
SUOR BANHANDO O IMAGINÁRIO
MUITOS DEDOS POUCAS BOCAS
UMAS MENTIRAS MACIAS...
E TODO ESSE DESEJO... 
E TODA ESSA MAGIA...
E TODA ESSA POESIA!



segunda-feira, 18 de novembro de 2013

O Destino do Papel

Uma folha de papel branca, pura, limpa, estática sobre a mesa.
Aguardando a poesia, a gravura, o lápis de cor da menina, o giz de cera, a aquarela... Ou seria a impressão do contrato, do orçamento, do processo...

Essa mesma folha de papel, por um sopro distraído, foge ao seu destino e se curva ao vento. Vira pássaro vivo por um momento mágico, e sente toda a vida ao fugir do escritório, sobrevoar a poluição e se perder entre as folhas vivas do parque que fica ao lado.


Destino estranho para o papel... Podia ser guardado, ser lembrado...

Se jogou, se perdeu e vai ser esquecido e consumido por seu íntimo orgânico!




Uma flor de papel branca, pura, limpa, estática sobre a mesa!

Tem história, tem nela todos os movimentos daqueles dedos, daquelas mãos que delicadamente moldaram o papel para o sentimento mais puro, de trazer sorriso, de fazer carinho.
Dedos fortes, dedos masculinos, sensibilidade de artista mudo.
Dedos que tornaram coisa o papel e ele não voou.

A folha de papel branco sobre uma pilha inorgânica estática e triste pode, de repente, ganhar tinta e ser personagem de sua história: imagem, lenda. Pode ganhar fantasia: céus com várias luas e animais mais incríveis que os monolunáticos lobisomens...

Pode ter imagens inimagináveis destes seres mitológicos e ser interessante e valiosa e percorrer gerações. Pais e filhos compartilhando lendas e sagas plenas de ilustrações fantásticas e dimensões inalcançáveis em outras circunstâncias...

Uma folha de papel... folha simples, pura, cheia de vida sobre a mesa...

Vai virar flores, cores, grama, o pôr do sol, o beijo, o cheiro, o gosto e a textura...
Coisas que não são, mas que por não serem, são mais, e coisam mais... E tocam mais!






FINITO

E EIS QUE RASGA-ME O DESENCONTRO
JUSTO A MIM QUE PINTA TUDO SE FALTA COR
DEPAREI-ME COM A PALIDEZ:
CINZA BRINCANDO DE BRANCO

A PARTIDA - O LUTO - UNS TONS DE PRETO
VISITA RÁPIDA DE UM TEMPO-QUANDO
A ANGÚSTIA - O IMENSO VÃO NO PEITO
A TRISTE E SÉRIA EXPRESSÃO NO ROSTO

O ADEUS NA PARTIDA, INSIGNIFICANTE
QUASE TÃO NADA QUANTO O PRIMEIRO OI
O FECHO DE CICLO NUM DIA BRILHANTE
UM ADEUS TARDIO, O CORAÇÃO ERRANTE

TUDO VAZIO NAQUELE ROMANCE...
E AS CORES... AS CORES TEIMANDO POESIA!


quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Pedaços de mim


As palavras correm pelas minhas veias quase mais intensas que os sentimentos!

Não sei de onde vim, não sei pra onde vou, nem quando. Vivo no meio.

Alguns lugares me contêm... Outros me convêm!
Me reconheço nas curvas do caminho, nas ruas por onde perambulo.
Há lugares aos quais sempre vou pertencer.

Deixo um pedaço de mim e carrego parte de tudo que me atravessa, e assim vou me compondo em peças de montar.


Parece que sempre estive lá, às vezes. 

Noutros momentos sinto que nunca cheguei, mas que desde sempre era para estar.
Vivo o reconhecimento diário do desconhecido, do inesperado, do escrito nas estrelas e improvável....
Encontro pessoas pelo caminho, que sempre estiveram em meu ser, mesmo inéditas....

Marias, Joões.... Penélopes, Guilhermes... Todos eles são mais que nomes, mais que encontros de caminhos, todas as pessoas que me cruzam estão em mim, e me levam... 

Todos eles, todas elas, todos os chãos por onde pisei, todos os céus acima de mim... TUDO está em mim e lá também estou.... mas não nos temos!

Tenho os sentimentos, fortes ou não, antes inéditos e depois maiores e meio monótonos... Ironias de um caminho nunca antes imaginado, que aconteceu por acaso e que era, em si, o que tinha que ser! 


Conceitos e preconceitos me transformam em construção interminável.

O que era entulho deixa de ser e o que era tudo vira nada e mostra o valor dos anos, o caminho dos pés, o apoio das mãos, os sonhos do coração e a grandeza da alma menina. Mostrar, todavia, não diz, não junta peças... mostrar é espelho!

É no espelho que está a magia que os olhos dos outros não são capazes de ver.

O espelho é um portal, talvez uma janela, um olhar para a montagem e um ar de contemplação que volta, que não ousa juntar peças, mas que às vezes sai a reorganizá-las.

Onde me vejo de fato, não é no vidro refletor, me vejo onde me reencontro com quem nunca fui e com quem nunca me será.... 

Me vejo na dinâmica interativa dos caminhos tortuosos da vida, que a arte não consegue imitar.... 
Me reconheço num ser de novidades constantes e de composições, umas mais simples, outras mais complexas e todas com algo de inimitável, de inesperado, de encantador e único!

Me reconheço no ser que nasce de tudo que me contém, dos lugares a que pertenço, na novidade, na surpresa, no inédito que por vezes acompanha o monotonamente comum... 


É onde sempre estive, é meu paradoxo: sempre serei o que nunca ousei ser e SOU!



terça-feira, 12 de novembro de 2013

FLOR DO CERRADO


Uma frase no mato:
Nasce no mato uma flor vermelha!

Jorra de dentro a vontade
Coragem voa ao vento
se desfaz e cumpre seu breve tempo
Vida ao vento sem coragem

Muda tudo e vira bicho

Bicho anda come vive enfrenta 
luta cresce cuida ensina busca
e se pensa vira GENTE

Gente flor, Gente bicho
ao léu ao léu ao léu

Gente pensa sente ensina
acredita escolhe prepara cuida protege

Guarda dor e medo na caixinha e vai!
só com fé amor perdão
alma expande, cresce o coração
aura armadura pinta o mundo colorê...

***

Morrer doer lutar vencer
sorrir cair subir amar

Vai pro alto... Vai!!!
Solta a cabeça, abraça o coração e vai...

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

TERRA DO NUNCA

Inspirada na poesia em prosa de SER acabo de trazer em umas palavras sentimentos intraduzíveis, uma leitura sequencial pode ajudar a entender a essência, mas são ambos textos completos em sua simplicidade complexa..... Espero que te incomode e te dê prazer!



Nunca é coisa! Nunca é gente! Nunca é bicho! Também, o que poderia ser? Afinal, tudo que há carrega em si uma injusta teoria. Se não é na mente não há no mundo, mas mesmo quando o não do mundo o sim da mente vira o que não há e é! E por que não ser??

Aconteço no que não existe. Me afirmo. Me reconheço. Me seduzo nas linhas brilhantes do imaginário. 

Por onde caminho? Quem vai comigo? Que coisas há por aqui? Que cores há por aqui? Pode ser que não haja uma estrada... Pode ser que ninguém venha comigo... Pode ser que não haja coisas ou cores... 

Isso não importa! Quando vou, decido ir. O que não há eu mesma invento. E assim, é melhor que não haja!

Assim a amiga companheira pode filtrar sonhos com asas nos pés e voamos juntas para o Reino das Bolinhas de Sabão... O amor no peito pode ter os traços que eu desenhar, pode mudar quando eu escolher e furtar-me cores em seus olhos. Ele pode ser poeta..!

Os caminhos não são retos, eles curvam, sobem e descem para garantir olhos para todos os cantos. Cantos gigantes, outros minúsculos. 
Rios e cascatas me cruzam quando tenho sede ou calor. 
Cores invadem nuvens ora comestíveis ora camas voadoras que me levam quando canso... 
Frutas amadurecem aos meus olhos se tenho fome e no mesmo galho colho morangos amoras uvas e chocolate...

Se sinto frio, aqueço o sol. O mundo do nunca é gigante Pasárgada: Lá o que penso há e não existe o que entristeço!